O lugar no contexto

(1) Entidade geográfica mencionada

Mogores. Mogor 43(1), 185(1).

Nas orações: 519, 2771.

  1. [519](Cap. 43) Chegado este homẽ jũto de Antonio de Faria, vendo elle que era brãco como qualquer de nós, lhe perguntou se era Turco ou Parsio, ao que elle respondeo que não, mas que era Christão, natural de monte Sinay, onde estaua o corpo da bemauenturada santa Caterina, a isto lhe replicou Antonio de Faria, que pois era Christão como dezia, como não andaua entre Christãos, a que elle respondeo que era mercador, & de boa progenie, por nome Tome Mostãgue, & que estãdo surto com hũa nao sua no porto de Iudaa no anno de 1538. o Soleimão Baxà Visorrey do Cayro lha mandara tomar, como fizera a mais outras sete, para trazerem mantimẽtos & muniçoẽs para fornimento da armada das sessenta galês em que vinha por mandado do Turco, para restituyr o Soltão Baudur no reyno de Cambaya, de que o Mogor naquelle tempo o tinha desapossado, & lançar os Portugueses fora da India, & que vindo elle na mesma nao para a beneficiar & arrecadar o seu frete que lhe tinhão prometido, os Turcos, alem de lhe mentirem em tudo como sempre costumão, lhe tomarão sua molher, & hũa filha pequena que trazia comsigo, & perante elle as deshonraraõ publicamente, & porque hum filho seu, chorando se lhes queixou deste grande mal, lho lançaraõ viuo ao mar, atado de pees & de mãos, & a elle meteraõ em ferros, & lhe dauão todos os dias muytos açoutes, & lhe tomarão sua fazenda, que eraõ mais de seis mil cruzados, dizẽdo, que não era licito lograr beẽs de Deos, senão os Massoleymoẽs, justos & santos assi como elles; & porque neste meyo tempo lhe faleceraõ a molher & a filha, elle como desesperado se lançara hũa noite ao mar na barra de Diu, com aquelle moço seu filho, donde por terra fora ter a Çurrate, & dahy se viera ter a Malaca em hũa nao de Garcia de Saa Capitão de Baçaim, donde por mandado de dõ Esteuão da Gama fora à China com Christouão Sardinha, que fora feitor de Maluco, o qual estando hũa noite surto em Cincaapura, o Quiay Taijão senhor daquelle junco matara cõ mais vinte & seis Portugueses, & que a elle por ser bombardeyro dera a vida, & o trazia comsigo por seu Cõdestabre.
  2. [2771](Cap. 185) E desta maneyra caminhou tanto atè que entrou pela terra de el Rey de Sião, & auendo jâ cinco dias que caminhaua por ella, chegou a hũa fortaleza que se dezia Tapurau, em que auia perto de dous mil vezinhos, de que era capitaõ hum Mogor por nome Coge Taraõ homem esforçado & muyto ardiloso na guerra.

Mogores 20(1), 45(1), 95(1), 103(1), 106(1), 114(1), 119(1), 122(1), 123(1), 124(1), 146(1), 149(1).

Nas orações: 224, 538, 1176, 1325, 1395, 1523, 1609, 1637, 1672, 1677, 2040, 2111.

  1. [224](Cap. 20) E tambẽ trouxe informação da bahia onde se perdera o Rosado Capitão da nao Frãcesa, & Matalote do Brigas Capitão da outra nao, que por caso de tempo esgarraõ foy ter a Diu no anno de 1529. sendo ainda viuo Soltão Baudur Rey de Cambaya, que a todos os Franceses della fez Mouros, que eraõ oitenta & dous, os quais despois sendo Elches, leuou no anno de 1533. por bombardeiros, na guerra que teue co Rey dos Mogores, onde todos morreraõ, sem hum sò ficar viuo.
  2. [538](Cap. 45) Estes dizião que esta ilha era senhorio absoluto por sy, & de hum Rey muyto rico, o qual, por nome mayor & mais aleuantado sobre todos os Monarchas daquelle tẽpo, se dezia Prechau Gamuu, este falecẽdo sem deixar herdeyro, ouue nos pouos muyto grande discordia sobre quẽ soccederia no reyno, a qual foy em tanto crecimento, & chegou a derramar tanto sangue, que affirmão as chronicas que disso tratão, que em sós quatro annos & meyo morrerão a ferro dezasseis lacasaas de homẽs, & cada lacasaa tẽ cem mil, pela qual causa ficou a terra tão vazia de defensores, & tão desemparada, que o Rey dos Cauchins a conquistou, & se fez senhor della com sós sete mil Mogores que o Tartaro lhe mandou da cidade de Tuymicão que naquelle tẽpo era a metropoli do seu imperio.
  3. [1176](Cap. 95) E em todas estas trezẽtas & quinze legoas não ha mais entradas que sós cinco que os rios da Tartaria fazem por estas partes, pelos quais decendo com impetuosa corrente, com que cortão por este sertão espaço de mais de quinhentas legoas, se vão meter no mar da China & da Cauchenchina, & hum destes, porque he mais poderoso que os outros, vay sayr no reyno Sornau (aque o vulgar chama Sião) pela barra de Cuy, & em todas estas cinco entradas o Rey Chim tem hũa força, & o Tartaro outra, em cada hũa das quais o Chim tem sete mil homẽs continuos aque paga muyto grandes soldos, de que os seis mil saõ de pè, & os mil de cauallo, & a mayor parte desta gente he estrangeyra, como saõ Mogores, Pancrùs, Champas, Coraçones, & Gizares da Persia, & outros de outras muytas terras & reynos que pelo amago deste sertão habitão, porque na verdade os Chins não saõ muyto homẽs de guerra, porque alem de serem pouco praticos nella, saõ fracos de animo, & algum tanto carecidos de armas, & de todo faltos de artilharia.
  4. [1325](Cap. 103) Encima dos primeyros tres degraos desta tribuna estauão oito porteyros cõ suas maças de prata em pé, & embaixo no chão sessenta homẽs Mogores muyto bem despostos, em duas fileyras, assentados em joelhos, com alabardas atauxiadas douro nas mãos, & na dianteyra destes, em pé, como tenentes, ou cabos de esquadras dous gigantes fantasticos muyto bem despostos, & ricamẽte vestidos, com seus treçados a tiracollo, & alabardas muyto grandes nas maõs, os quais os mesmos Chins chamão em sua lingoa gigauhos; em ambas as quadras desta tribuna estauão duas mesas muyto compridas postas embaixo na casa, a cada hũa das quais estauão assentados doze homẽs, dos quais os quatro erão como juizes ou corregedores, os dous escriuaẽs, outros quatro procuradores, & outros dous conchalys, que saõ como desembargadores, ou chançareis, & hũa destas mesas cos doze officiaes que tinha, era do crime, & a outra cos outros doze officiaes, era do ciuil, & todos os officiaes dambas estas mesas estauão vestidos de hũas vestes de citim branco muyto compridas & com mangas largas, para mostrarem com isto a largueza & a pureza da justiça.
  5. [1395](Cap. 106) Este Chaem, por ser mais honrado que todos os outros, traz hum estado tão grandioso como qualquer Tutão, porque traz trezentos Mogores de guarda, & vinte & quatro porteyros de maças, & trinta & seis molheres em facas brancas com jaèzes de prata, & gualdrapas de seda, tangendo em estromentos suaues & cantando a elles, com que fazem musica a seu modo muyto bem concertada, & vinte cauallos a destro em osso com suas cubertas de brocado & de tella de prata, & o pescoço todo guarnecido do mesmo, & com bocais de campainhas de prata, & junto com cada hum delles vão seis alabardeyros, & quatro homẽs da estribeyra muyto bem concertados, & diante de todo este aparato vão mais de quatrocentos vpos cõ grande soma de cadeas de ferro muyto compridas que vão arrojando pelo chão, com hũa desordem & hum estrondo tão medonho que fazẽ tremer as carnes a toda a pessoa, & vão doze homẽs a cauallo que se chamão peretandas, cõ sombreyros de citim cramesim nas maõs a modo de esparaueis postos em asteas muyto compridas, & outros doze com bãdeyras de damasco branco, com suas franjas & rẽdas douro muyto largas.
  6. [1523](Cap. 114) E abaixo destes doze ha quarẽta Chaẽs, que saõ como Visorreys, a fora outras muitas dignidades mais inferiores, que saõ como Regedores, Gouernadores, Veadores da fazenda, Almirantes, Capitaẽs mores, que se nomeão por Anchacys, Aytaos, Põchacys, Lauteaas, & Chũbins, os quais todos ainda que nesta cidade, que he a corte, saõ mais de quinhentos, nenhum traz estado de menos de duzentos homẽs, & os mais delles, para mayor espanto, saõ gentes estrangeyras de diuersas naçoẽs, dos quais a mayor parte saõ Mogores, Persios, Coraçones, Moẽs, Calaminhãs, Tartaros, & Cauchins, & algũs Bramaas, do Chaleu & Tanguu, porque dos naturais não fazem conta por ser gente fraca, & para pouco, inda que muyto habiles & engenhosos em todo o negocio mecanico, & de agriculturas, & arquiteitos de engenho muyto viuo, & inuẽtores de cousas muito sotis & artificiosas.
  7. [1609](Cap. 119) E subindo logo nas costas destes tres Portugueses todos os Tartaros que estauão ao pé das escadas, o que tambem fizeraõ com muyto esforço, assi por terem seu Capitão diante, como por serem de sua natureza quasi tão determinados como os Iapoẽs, em muyto breue espaço foraõ encima do muro mais de cinco mil dos da nossa parte, os quais com o impeto que leuauão fizeraõ retirar os Chins, & a briga se trauou entre hũs & os outros tão braua, & tanto sem piedade, que em pouco mais de meya hora o negocio ficou logo concluydo, & o castello tomado cõ morte de dous mil Chins & Mogores que estauão dentro nelle, & dos Tartaros não mais que até cento & vinte.
  8. [1637](Cap. 122) Estes quatro moços & o Mitaquer que era o que nos guiaua, passaraõ daquy por hum corredor armado sobre vinte & seis colunas de bronzo, & delle entramos em hũa grande sala de madeyra como terecena, na qual estaua muyta gente nobre, em que auia alguns estrangeyros Mogores & Persios, Berdios, Calaminhãs, & Bramaas do Sornau Rey de Sião.
  9. [1672](Cap. 123) E ao outro dia passando â vista da cidade de Caixiloo, a não quiz cometer, por ser grande & forte, assi por sitio & fortificação, como por ter sabido que estauão dentro nella cinquenta mil homens, em que entrauão dez mil Mogores, & Cauchins, & Champaas, gente mais determinada & pratica na guerra que a da China.
  10. [1677](Cap. 124) E despois de a ter toda recolhida, se passou para outra cidade muyto mayor & muyto mais nobre, que se chamaua Tuymicão, onde foy visitado pessoalmente de algũs principes seus comarcãos, & por embaixadores o foy tambem doutros Reys & senhores de mais longe, de que os principaes forão seis assaz grandes & poderosos, quais forão o Xatamaas Rey dos Persas, o Siammom Emperador dos Gueos, que confina por dentro deste sertão co Bramaa do Tanguu, o Calaminhan senhor da força bruta dos elifantes da terra, como ao diante direy quando tratar delle, & do seu senhorio, o Sornau de Odiaa, que se intitula Rey de Sião, cujo senhorio cõfina por distãcia de setecentas legoas de costa, como he de Tanauçarim a Champaa cos Malayos & Berdios & Patanes, & pelo sertaõ, co Passiloco & Capimper, & Chiammay, & Lauhos, & Gueos, de maneyra que este somente tem dezassete reynos em seu senhorio, o qual entre esta gentilidade toda se intitula por grao mais supremo, senhor do elifante branco, outro era o Rey dos Mogores, cujo reyno & senhorio jaz por dentro do sertão entre o Coraçone que he jũto da Persia, & o reyno do Dely & Chitor, & hum Emperador que se chamaua o Carão, cujo senhorio, segũdo aquy soubemos, confina por dentro dos montes de Goncalidau em sessenta graos auante, com hũa gente a que os naturaes da terra chamão Moscoby, da qual gente vimos alguns homens aquy nesta cidade, que saõ ruyuos, & de estatura grande, vestidos de calçoẽs, roupetas & chapeos ao modo que nesta terra vemos vsar os Framengos & os Tudescos, & os mais honrados trazião roupoẽs forrados de pelles, & algũs de boas martas, trazião espadas largas & grandes, & na lingoagem que fallauão lhe notamos algũs vocablos Latinos, & quando espirrauão dezião tres vezes dominus, dominus, dominus.
  11. [2040](Cap. 146) Chegado, como digo, este Heredim Mafamede a Tanauçarim, fez logo prestes esta armada de cinco fustas, quatro galeotas, & hũa galé real & embarcou nella oitocentos Mouros de peleja, a fora a chuzma do remo, em que entrauão trezentos Ianizaros, & os mais eraõ Turcos, Gregos, Malauares, Achẽs, & Mogores, gẽte toda muyto escolhida, & exercitada na guerra, em que parecia que a victoria estaua muyto certa, & com ella se sahio do porto de Tanauçarim em busca dos nossos, que neste tempo estauão nesta ilha de Pullo Hinhor de que este Christão era Rey, o qual nesta conjunção que esta armada se fazia, acertou de estar lá na cidade vendendo hũ pouco de peixe seco.
  12. [2111](Cap. 149) E querendo este Rey Bramaa por grandeza de estado festejar esta entrega do Chaubainhaa, mandou que todos os capitaẽs estrangeyros com sua gente armada & vestida de festa se pusessem em duas fileyras a modo de rua para vir por ella o Chaubainhaa, o que logo foy feito, & esta rua tomaua desda porta da cidade até a sua tenda que seria distancia de dous terços de legoa, na qual rua estauão trinta & seys mil estrangeyros, de quarenta & duas naçoẽs, em que auia Portugueses, Gregos, Venezeanos, Turcos, Ianiçaros, Iudeus, Armenios, Tartaros, Mogores, Abexins, Raizbutos, Nobins, Coraçones, Persas, Tuparaas, Gizares, Tanocos da Arabia Felix, Malauares, Iaos, Achẽs, Moẽs, Siames, Lusoẽs da ilha Borneo, Chacomaas, Arracoẽs, Predins, Papuaas, Selebres, Mindanaos, Pegùs, Bramâs, Chaloẽs, Iaquesaloẽs, Sauadis, Tãgus, Calaminhãs, Chaleus, Andamoens, Bengalas, Guzarates, Andraguirees, Menancabos, & outros muytos mais a que não soube os nomes.

(2) Objecto geográfico interpretado

Império. Parte de: India.

Referente contemporâneo: Āgra, India (AS). Lat. 27.183330, long. 78.016670.

Gentílico. GT s.v. Mogor, império do: no apogeu desde os Himalaias até o golfo de Bengala no sul e até Pérsia a leste. FMPP (vol.4, pp. 74-75) distingue entradas para Magores, Mogores, Mongols e Mughals, apesar de esta distinção inicial, regista baixo a voz Mongol as ocorrências referidas aos Tártaros e lista ocorrências nas que se mesturam as formas Mogor e Tártaro. Porém, nas notas de Françoise Aubin (FMPP vol. 3, pp. 153-4) o nome Mogor ‘more probably designates the Mughal (or Moghul) Empire, founded in India in 1526 by Babur. All the more since, in chapter 124, the author locates the kingdom of the Mogores between Persia and India’. Concordo com esta última apreciação. Mogor e Tártaro são termos totalmente distintos em FMP. Primeiramente assinalar que FMP apenas usa a forma Mogor, não achamos nenhuma outra variante não sendo o plural Mogores. Magores aparece no capítulo 166 e ainda que se não possa desbotar uma relação com os mongóis, o contexto parece aconselhar um reino próprio ou principado com referência no Sudeste de Ásia. Fica assim pois só a forma Mogor, usada nas ocorrências inequívocas para se referir ao império do subcontinente indiano e aparece mesmo situado com precisão no capítulo 124 como reino que jaz ‘entre o Coraçone que é junto Persia e o reino de Dely e Chitor’. François Aubin confirma a precisão de Pinto para esta ocorrência (FMPP vol. 3, p.159) ‘Pinto appears to be rather well informed’ e indentifica o Rei Mogor com Humayun como também fai Anthony Reid (FMPP vol. 3, p. 62). Nas ocorrências em que não se nos diz a procedência dos mogores nem se faz menção a uma sua figura histórica, aparecem como mercenários ao serviço de outros povos (chineses principalmente, também com o Tártaro e Sião) com contextos que não permitem ambiguidade a respeito dos tártaros: nos capítulos 114, 119 e 149 mogores e tártaros são mencionados como povos distintos, no 124 os mogores são estrangeiros na corte do Tártaro e no 119 aparecem lutando contra os tártaros. Finalmente ficam como as ocorrências mais ambiguas, cap. 45 em que o Rei Tártaro envia sete mil mogores ao rei Cauchim para conquistar Ainão: se consideramos que os mogores eram estrangeiros e lutavam como faziam outros povos estrangeiros com o Tártaro não há lugar tampouco a confusão. Assim, os únicos casos em que os mogores aparecem claramente identificados geograficamente referem-se ao império Mughal, nos casos nos que se não dão referências geográficas, é sempre em funções de milícia estrangeira, claramente identificados como distintos dos tártaros. Em nenhuma das ocorrências mais ambiguas há elementos que impeçam uma identificação com o império Mughal: o contraste de fontes históricas poderia determinar ou confirmar uma adscrição precisa, na sua ausência apenas evidenciamos que, em paralelo com as formas inequívocas e menos ambiguas, o contexto permite e mesmo favorece uma adscrição ao império Mughal. Concluo. Parece óbvio que a forma Mogor em Pinto aparece referida apenas para os Mughals.

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