O lugar no contexto

(1) Entidade geográfica mencionada

Calaminhan. Calaminhan 41(1), 107(1), 124(1), 153(1), 157(2), 158(4), 162(6), 163(6), 164(6), 165(8), 167(2), 170(1), 185(1).

Nas orações: 499, 1402, 1677, 2181, 2234, 2238, 2247, 2248, 2249, 2327, 2329, 2337, 2338, 2340, 2351, 2356, 2371, 2372, 2377, 2380, 2381, 2382, 2387, 2390, 2410, 2411, 2412, 2414, 2418, 2421, 2425, 2432, 2474, 2478, 2551, 2767.

  1. [499](Cap. 41) E no meyo de toda esta terra, ou reyno, como ja foy antiguamente, està hum grande lago, a que os naturaes da terra chamão Cunebetee, & outros o nomeão por do Chiammay, do qual procede este rio com outros tres mais que regão muyto grande quantidade desta terra, o qual lago, segundo affirmão os que escreueraõ delle, tem em roda sessenta jaõs, de tres legoas cada jão, ao longo do qual ha muytas minas de prata, cobre, estanho, & chumbo, de que continuamente se tira muyta quantidade destes metais que de veniaga leuão mercadores em cafilas de alifantes & badas aos reynos de Sornau, que he o de Sião, Passiloco, Sauady, Tangù, Prom, Calaminhan, & outras prouincias que pelo sertão desta costa de dous & tres meses de caminho estão diuididas em senhorios & reynos de gentes brancas, de baças, & de outras mais pretas.
  2. [1402](Cap. 107) Esta cidade do Pequim de que promety dar mais algũa informaçaõ da que tenho dada, he de tal maneyra, & tais saõ todas as cousas della, que quasi me arrependo do que tenho prometido, porque realmente não sey por onde comece a cumprir minha promessa, porque se não ha de imaginar que he ella hũa Roma, hũa Constantinopla, hũa Veneza, hum Paris, hum Londres, hũa Seuilha, hũa Lisboa, nem nenhũa de quantas cidades insignes ha na Europa por mais famosas & populosas que sejão, nem fora da Europa se ha de imaginar que he como o Cairo no Egypto, Taurys na Persia, Amadabad em Cambaya, Bisnagà em Narsinga, o Gouro em Bẽgala, o Auaa no Chaleu, Timplaõ no Calaminhan, Martauão & Bagou em Pegù, ou Guimpel & Tinlau no Siammon, Odiaa no Sornau, Passaruão & Demaa na ilha da Iaoa, Pangor no Lequîo, Vzanguee no graõ Cauchim, Lançame na Tartaria, & Miocoo em Iapaõ, as quais cidades todas saõ metropolis de grandes reynos, porque ousarey a affirmar que todas estas se não podem comparar com a mais pequena cousa deste grãde Pequim, quanto mais com toda a grandeza & sumptuosidade que tem em todas as suas cousas, como saõ soberbos edificios, infinita riqueza, sobejissima fartura & abastança de todas as cousas necessarias, gente, trato, & embarcaçoẽs sem conto, justiça, gouerno, corte pacífica, estado de Tutoẽs, Chaẽs, Anchacys, Aytaos, Puchancys, & Bracaloẽs, porque todos estes gouernão reynos & prouincias muyto grandes, & cõ ordenados grossissimos, os quais residem continuamente nesta cidade, ou outros em seu nome, quando por casos que soccedem se mandão pelo reyno a negocios de importancia.
  3. [1677](Cap. 124) E despois de a ter toda recolhida, se passou para outra cidade muyto mayor & muyto mais nobre, que se chamaua Tuymicão, onde foy visitado pessoalmente de algũs principes seus comarcãos, & por embaixadores o foy tambem doutros Reys & senhores de mais longe, de que os principaes forão seis assaz grandes & poderosos, quais forão o Xatamaas Rey dos Persas, o Siammom Emperador dos Gueos, que confina por dentro deste sertão co Bramaa do Tanguu, o Calaminhan senhor da força bruta dos elifantes da terra, como ao diante direy quando tratar delle, & do seu senhorio, o Sornau de Odiaa, que se intitula Rey de Sião, cujo senhorio cõfina por distãcia de setecentas legoas de costa, como he de Tanauçarim a Champaa cos Malayos & Berdios & Patanes, & pelo sertaõ, co Passiloco & Capimper, & Chiammay, & Lauhos, & Gueos, de maneyra que este somente tem dezassete reynos em seu senhorio, o qual entre esta gentilidade toda se intitula por grao mais supremo, senhor do elifante branco, outro era o Rey dos Mogores, cujo reyno & senhorio jaz por dentro do sertão entre o Coraçone que he jũto da Persia, & o reyno do Dely & Chitor, & hum Emperador que se chamaua o Carão, cujo senhorio, segũdo aquy soubemos, confina por dentro dos montes de Goncalidau em sessenta graos auante, com hũa gente a que os naturaes da terra chamão Moscoby, da qual gente vimos alguns homens aquy nesta cidade, que saõ ruyuos, & de estatura grande, vestidos de calçoẽs, roupetas & chapeos ao modo que nesta terra vemos vsar os Framengos & os Tudescos, & os mais honrados trazião roupoẽs forrados de pelles, & algũs de boas martas, trazião espadas largas & grandes, & na lingoagem que fallauão lhe notamos algũs vocablos Latinos, & quando espirrauão dezião tres vezes dominus, dominus, dominus.
  4. [2181](Cap. 153) E porque ja neste tempo tinha atoardas que o Rey do Auaa, confederado cos Sauadijs, & Chaleus daua entrada ao Siammon (que pelo sertão destes reynos confina a Loeste & a Loesnoroeste co Calaminhan Emperador da força bruta dos elifantes da terra, como adiante declararey quando tratar delle) para que tomasse as fortalezas do reyno Tanguu a este Bramaa, elle como bom capitão & muyto pratico & astuto nas cousas da guerra, mandou logo primeyro que tudo prouer bem de gente & de todo o necessario as principaes quatro forças que tinha, & de que mais se arreceaua.
  5. [2234](Cap. 157) Pelo que sendo este tyranno auisado de todas estas cousas, temendo poder ser esta â mais certa occasião de se perder que todas as outras de que se podia arrecear, se tornou logo a fortificar o Prom com muyto mayor instancia do que até então tinha feito, porem antes que se partisse daquelle rio onde estaua surto, que seria hũa legoa desta cidade do Auaa, mandou o Bramaa seu tisoureyro por nome Dio soray (em cujo poder eu atras jâ disse que estauamos os oito Portugueses catiuos) por embaixador ao Calaminhan, que he hũ principe de grãde poder que habita no amago deste sertão em muyta distancia de terra, do qual adiante tratarey hum pouco quando vier a dar informaçaõ delle, paraque por liga & contrato de noua amizade se fizesse seu irmão em armas, offerecendolhe por isso certa quantidade douro & pedraria, & rendimentos de algũas terras comarcãs ao seu reyno, paraque este Calaminhan entretiuesse com guerra ao Siammon o verão seguinte, com que não pudesse soccorrer o Rey do Auaa, & lhe ficasse a elle mais facil poder tomar esta cidade, sem receyo deste socorro de que se temia.
  6. [2238](Cap. 158) Pareceome razão & cõueniente às cousas de que vou tratando apartarme agora hum pouco deste tyranno Bramaa, ao qual me tornarey a seu tempo, para tratar do caminho que fizemos daquy para a cidade de Timplão metropoli deste imperio Calaminhan, que quer dizer, senhor do mundo, porque na sua lingoa, cala, he senhor, & minhan he mundo, & por outra via se intitula tambem, absoluto senhor da força bruta dos elifantes da terra, porque na verdade este o he mais que outro nenhum em todo o vniuerso como adiante se dirâ.
  7. [2247](Cap. 158) Daquy costeamos o rio pela parte do Sul por espaço de mais sete dias, & chegamos a hũa grande cidade por nome Catammaas, que em nossa lingoagem quer dizer, camarão douro, do senhorio do Raudiuaa de Tinlau, filho segundo do Calaminhan, que he como em França o duque de Orliens.
  8. [2248](Cap. 158) O Naugator desta cidade agasalhou bem este embaixador, com muytos refrescos para todos os seus, & lhe deu por nouas que o Calaminhan estaua na cidade de Timplão.
  9. [2249](Cap. 158) Daquy partimos hum Domingo pela menham, & ao outro dia á vespera fomos ter a hũa fortaleza que se dezia Campalagor, situada sobre hũa ponta de rocha metida no rio a modo de ilheo, cercada de boa cantaria, com tres baluartes, & duas torres de sete sobrados, dentro dos quais disseraõ ao Embaixador que tinha o Calaminhan hum grosso tisouro dos vinte & quatro que estauão repartidos pelo reyno, de que a mayor parte era em prata, o qual teria de peso seys mil candins, que da nossa conta saõ vinte & quatro mil quintais, o qual todo estaua em poços debaixo do chaõ.
  10. [2327](Cap. 162) Aquy chegou hum homẽ num seroo ligeiro, & disse ao Embaixador que fosse surgir ao diuão de Campalagrau, que era hum dos dous castellos que estaua da banda do Sul, para mostrar aly a carta que leuaua do seu Rey para o Calaminhan, & se ver se vinha na forma ordinaria com que se lhe custuma a falar, o que o Embaixador logo fez, & desembarcando em terra, entrou em hũa grande casa, onde estauão tres homẽs assentados a hũa mesa acompanhados de outra muyta gente nobre, os quais o receberaõ com gasalhado, & preguntandolhe o que queria como homẽs que naõ sabiaõ o a que vinha, lhes respõdeo elle que era Embaixador do Rey do Bramaa senhor do Tanguu, & trazia hũa embaixada para o santo Calaminhan sobre cousas muyto importantes a seu estado.
  11. [2329](Cap. 162) Despois que o despacharaõ nesta mesa da primeyra tauangraa, nos fomos â outra que estaua mais adiante, daly hũa legoa, pelo rio acima, na qual achamos outros homẽs de muyto mòr respeito, os quais tambem cõ outra noua cerimonia viraõ a carta & o presente, & pusersõ em todas as peças hũs cordoẽs de retròs encarnado com tres mutras de lacre, que foy o remate para a embaixada poder ser recebida do Calaminhan.
  12. [2337](Cap. 162) Agora nesta lũa em que estamos faz sete mil & trezẽtas & vinte lũas (que saõ seiscentos & dez annos pela conta das outras naçoẽs) que imperando na Monarchia dos vinte & sete reynos desta coroa hum santo Calaminhan, por nome Xixiuarom meleutay, sobre differenças que ouue entre elle & o Siãmon Emperador dos mõtes da terra, se ajũtaraõ de ambas as partes sessenta & dous Reys, os quais postos todos em cãpo, vieraõ a ter entre sy hũa cruel & aspera batalha, que durou desda hũa hora antemenham até os dous terços do dia passados, em que morreraõ de ambas as partes dezasseis laquesaas de homens, & cada laquesaa tẽ cẽ mil.
  13. [2338](Cap. 162) E ficando então a vitoria co nosso Calaminhan cõ sôs duzẽtos & trinta ma dos seus viuos, destruyo toda a terra dos inimigos em tẽpo de quatro meses de caminho, na qual destruyção foy tamanho o estrago da gẽte, que se he verdade o que as nossas historias contão, como muytos affirmão, nellas se acha que morrerão cinquẽta laquesaas de pessoas.
  14. [2340](Cap. 162) E por este respeito desta vitoria tão gloriosa todos estes pouos nos ficaraõ sogeitos cõ obrigaçaõ de parias hõrosas à coroa dos que agora gouernaõ o cetro da justiça Calaminhan, inda que tẽ custado assaz de sangue & trabalho em sessenta & quatro aleuãtamentos que dentaõ para câ ouue em todos estes pouos, os quais naõ podẽ sofrer verẽ seus deoses catiuos, porque na verdade he grande afrõta para elles, & sobre que tẽ feito voto de em quanto os naõ tirarẽ daquy naõ celebrarẽ festa nenhũa em que se enxergue alegria, nẽ nas suas brallas & casas de oraçaõ se accendeo mais fogo até o dia de oje, nem se acenderâ em quanto aquy estiuerem catiuos.
  15. [2351](Cap. 163) De que maneyra este Embaixador do Rey do Bramaa foy recebido no dia da sua entrada, & da grande magestade & aparato das casas do Calaminhan.
  16. [2356](Cap. 163) Chegados nòs com assaz de trabalho, pelo grande concurso de gente que auia pelas ruas, ao primeyro terreyro das casas do Calaminhan, que teria de comprimento quasi hum tiro de berço, & a largura em proporção conueniente, se deleitaraõ os olhos assaz no que viraõ nelle, porque a este tẽpo estaua (segundo algũs que o viraõ) cõ mais de seys mil de cauallo, todos com cubertas de seda, & arreyos de prata, & os homẽs todos armados de cossoletes de cobre & de latão, com suas celadas de argentaria, & bandeirinhas nas mãos, & rodellas & adargas nos arçoẽs das sellas, da qual gente era capitão o Queitor da justiça, que he o supremo Gouernador della sobre todos os ministros do ciuil & crime, que he jurisdição separada por sy com mero & misto imperio, de que não ha appellação nem agrauo.
  17. [2371](Cap. 163) Esta velha preguntou ao Monuagaruu que queria, ou porque tangera o sino, & elle lhe respondeo com acatamento, que trazia aly hum embaixador do Rey do Bramaa senhor do Tanguu, para tratar ao pé do Calaminhan algũas cousas importantes ao seu seruiço; da qual reposta a velha, pela grande autoridade de sua pessoa, mostrou que não fazia caso, de que todos ficamos espantados, por ser o que lhe falaua o principal senhor do reyno, & tio, segundo se dezia, do Calaminhan, & hũa das seys moças respondeo ao Monuagaruu pela senhora, & lhe disse, espere esse embaixador & vossa grandeza com todos os mais que vẽ com elle até se saber se he tempo para podermos beijar os peis a esta tribuna do senhor do mundo, & denũciar a seus ouuidos a vinda desse estrangeyro, & conforme à merce que nosso Senhor Deos nisso nos quiser fazer, assi se alegrarâ o seu coração & os nossos com elle.
  18. [2372](Cap. 163) E entrando para dentro se tornou a porta a cerrar, & assi esteue por cerimonia cerrada por espaço de tres ou quatro credos, no fim dos quais as seys moças pequenas a tornarão a abrir, porem não vimos então a velha que viera primeyro com ellas, mas vimos hum minino que poderia ser de noue até dez annos riquissimamente vestido, & cõ hũa hurfangaa douro na cabeça, que he a modo de mitra, mas fechada toda em roda sem abertura nenhũa, & hũa maça douro a modo de cetro posta ao ombro, o qual sem fazer caso do Monuagaruu, nem dos mais senhores que aly estauão, tomou o embaixador só pela mão, & lhe disse, aos peis da Binaigaa do santo Calaminhan cetro dos Reys que gouernão a terra, foy dada noticia da tua chegada, tão apraziuel a suas orelhas, que com boca de riso te manda buscar para em sua presença seres ouuido do que teu Rey lhe pede, a quem nouamente recebe na guarda de seus irmãos com amor de filho de suas entranhas, paraque fique poderoso sobre seus inimigos; & metẽdoo das portas para dentro co Monuagaruu sómente, & cos tres senhores que vieraõ com elle, toda a outra mais gente ficou de fora: o embaixador então vendose tão desacompanhado dos seus, olhou tres vezes para tras descontente ao que parecia no rosto.
  19. [2377](Cap. 163) Passada esta casa chegamos a hũa porta onde estauão seys porteyros com maças de prata, & por ella entramos noutra casa riquissimamente fabricada, onde estaua o Calaminhan em hum teatro de grande magestade, fechado em roda cõ tres ordẽs de grades de prata, acõpanhado de doze molheres muyto fermosas, & riquissimamente vestidas, as quais estauão das grades para dentro assentadas nos degraos da tribuna, tãgendo em instrumentos suaues, a que sós duas cantauão a reuezes, & em todo cima onde sua pessoa estaua, estauão doze moças de noue até dez annos cada hũa assentadas em joelhos ao redor delle, com maças pequenas douro a modo de cetros, & hũa em pé que o estaua auanando, & embaixo, por todo o comprimento da casa estauão muytos homẽs velhos com mitras douro nas cabeças, & vestidos de queimoẽs & raudiuaas de citins & damascos, com guarniçoẽs largas de fio douro, & com maças de prata aos ombros, os quais todos podião ser sessenta ou setenta, & estes estauão todos encostados ao lõgo das paredes.
  20. [2380](Cap. 164) De que maneyra este Embaixador fallou ao Calaminhan, da reposta que lhe deu, & como nesta cidade se pregou antigamente a ley Euangelica.
  21. [2381](Cap. 164) Entrando o Embaixador nesta casa, como tenho dito, acompanhado dos quatro principes que o leuauão, se prostrou cinco vezes no chão, sem ousar de aleuantar os olhos para o Calaminhan, por acatamento notauel que se lhe tem, atè que o Monuagaruu lhe mandou que passasse adiante, & chegando junto da primeyra grade, sempre co rosto em terra, disse contra o Calaminhan em voz alta que todos ouuiraõ: As nuuẽs do ár que recreão os fruytos de que nos mantemos, tem diuulgado por toda a monarchia do mundo a grande magestade do teu poderio, pelo qual cubiçando o meu Rey, como perola rica, a tua amizade, se te manda por mim em seu nome entregar por irmão verdadeyro, & com obediencia honrosa por razão de seres tu mais velho, & elle mais moço, & como a tal te manda esta carta, por ser a joya suprema do seu tisouro, em que seus olhos mais se deleitão por honra & gosto, que em ser senhor dos Reys do Auaa, com toda a pedraria da serra Faleu, & Iatir, & Pontau.
  22. [2382](Cap. 164) O Calaminhan com rosto graue & seuero lhe respondeo, eu aceito em mim esta noua amizade, para em tudo satisfazer a teu Rey como a filho nouamente nacido de minhas entranhas.
  23. [2387](Cap. 164) Hũa das doze arrancando então hũa adaga de pedraria que tinha na cinta, escalou com ella o peixe por hũa ilharga, & lhe tirou de dentro a filha do Rey, a qual ao som daquella mesma foy beijar a mão ao Calaminhan, que com grande honra a assentou junto comsigo.
  24. [2390](Cap. 164) Iâ sobola tarde se recolheo o Calaminhan para outra casa de dentro acompanhado das molheres somente, & todos os mais se vierão co Mõuagaruu, o qual trouxe o Embaixador pela mão até a derradeyra sala, & aly se despidio delle, & o entregou ao Queytor, que o leuou para sua casa, onde sempre pousou até se tornar, que foraõ trinta & dous dias, em todos os quais foy bãqueteado dos principais senhores da corte com hum estranho modo de perfeição & riqueza; & nós os seus tambem fomos muyto bem prouidos de tudo o necessario em muyta abundancia, & em todos estes dias ouue sempre muytos passatempos de pescarias, caças, & outros muytos de diuersas maneyras, & por toda a cidade, & ao redor della vimos alguns edificios notaueis, & templos de pagodes sumptuosissimos, & de officinas & obras muyto ricas, entre os quais foy hum muyto mais nobre & sumptuoso que todos os outros da cidade, por nome Quiay Pimpocau, deos dos enfermos, em que auia hũa grande soma de sacerdotes com habitos pardos, & suas altirnas de damasco roxo, sobraçadas, como já disse algũas vezes, a modo de estolas, os quais por serem mais sabios que todos os outros das vinte & quatro seitas deste imperio, trazem hũa certa diuisa de cordoẽs amarellos, com que andaõ cingidos, a que o vulgar da gẽte por grao supremo de honra nomeya por Sigiputoẽs, que quer dizer homẽs perfeitos.
  25. [2410](Cap. 165) Em que se dà larga informação deste imperio do Calaminhan, & algũa do reyno de Peguu, & dos Bramaas.
  26. [2411](Cap. 165) Sendo ja passado hum mês despois que chegamos a esta cidade de Timplão onde então estaua a corte, requerendo o Embaixador a reposta da sua embaixada, lhe foy concedido fallar ao Calaminhan, que o recebeo com mostras de bom sembrante, & lhe fez gasalhado, & despois de tratar breuemente com elle do negocio a que vinha, o remeteo ao Mõuagaruu, que era, como ja disse, o supremo no gouerno do reyno, & nas cousas da guerra, por quem estes despachos ordinariamente corrião.
  27. [2412](Cap. 165) Este lhe deu a reposta do Calaminhan acompanhada de hum rico presente em retorno do que o Rey do Bramaa lhe mandara, & lhe escreueo hũa carta que dezia assi.
  28. [2414](Cap. 165) Dada esta carta ao Embaixador, elle se partio logo desta corte aos tres de Nouẽbro do anno de 1546. acompanhado dalgũs senhores que por mandado do Calaminhan foraõ com elle até hum lugar que se dezia Bidor, onde por despidida lhe deraõ hum grande banquete & algũas peças para sua pessoa.
  29. [2418](Cap. 165) Dos quais treze estados os onze saõ ja senhoreados de outras naçoẽs, que por distancia doutra maior terra cingem por cima toda esta corda dos Bramàs, na qual habitão dous grandes Emperadores, hũ por nome Siammon, & outro este Calaminhan, do qual agora determino de tratar somẽte.
  30. [2421](Cap. 165) A metropoli de todas estas cidades he esta de Timplão, na qual o mais do tẽpo reside este Emperador Calaminhan cõ toda sua corte.
  31. [2425](Cap. 165) Seguẽ estes pouos vinte & quatro seitas de differentes opinioẽs, nas quais ha tãta variedade & confusaõ de erronias & preceitos diabolicos, principalmente nos sacrificios de sangue de que vsaõ, que he espãto ouuillos, quãto mais velos, como nós algũas vezes vimos nos dias solẽnes dos seus teriuoos, mas a mayor & a mais frequẽtada seita de todas he a de hũ idolo, de que jà fiz mẽção muytas vezes, que se chama Quiay Frigau, Deos dos atamos do sol, porque este he o em que crè, & o que adora o Calaminhan, & todos os principais senhores do reyno, cujos grepos, menigrepos, & talagrepos, que saõ os seus sacerdotes, saõ tambem muyto mais honrados que todos os outros, & tidos do pouo em reputação de santos.
  32. [2432](Cap. 165) A corte deste Emperador Calaminhan he muyto rica, & de gente muyto polida.
  33. [2474](Cap. 167) Daquy seguimos nosso caminho por hum esteyro que se dezia Madur, mais cinco dias, & chegamos a hũa aldea por nome Mouchel, primeyro lugar do reyno de Pegù, no qual hũ ladrão muyto afamado por nome Chalagonim, que ahy andaua ao salto cõ trinta seroos bẽ cõcertados, & cõ boa gẽte, nos cometeo hũa noite, & pelejando cõ nosco ate quasi a menham, nos tratou de tal maneyra, que a nos fazer Deos muyta merce escapamos da briga cõ perda de cinco embarcaçoẽs das doze que traziamos, & morte de cẽto & oitẽta homẽs da nossa parte, em que entraraõ dous Portugueses, & o Embaixador ficou cõ hũ braço cortado, & cõ duas frechadas, de que esteue â morte, & nòs com todos os mais muyto feridos, & o presente que o Calaminhan mandaua, que valia mais de cem mil cruzados, foy tomado cõ outra muyta fazenda rica que vinha nas cinco embarcaçoẽs, & desta maneyra chegamos dahy atres dias á cidade de Martauão destroçados & roubados, & com a mayor & milhor parte da gente morta.
  34. [2478](Cap. 167) Despois que o Embaixador aquy em Martauão conualeceo das feridas que ouuera na briga, se partio para a cidade de Pegù, onde naquelle tempo, como atras fica dito, o Rey do Bramaa residia com toda sua corte, o qual sabẽdo da sua chegada, & da carta que trazia do Calaminhan em que lhe aceitara a liga da sua amizade o mãdou receber pelo Chaumigrem, seu colaço & seu cunhado, acompanhado de todos os grandes, & com hũa mostra de quatro batalhoẽs de gente estrangeyra, em que entrauão mil Portugueses, de que era capitão hum Antonio Ferreyra natural de Bragãça, homem de grandes espritos, & a quem este Rey daua doze mil cruzados de partido, a fora merces particulares que montauão quasi outro tanto.
  35. [2551](Cap. 170) Passados vinte dias despois que este Rey Bramaa chegou â cidade de Pegù, vendo que na carta que o seu Embaixador lhe trouxera do Calaminhan lhe dezia elle que por seu Embaixador tomaria com elle conclusaõ na liga que ambos querião fazer nouamente contra o Siammõ, & que esta se não podia ja effeituar aquelle verão, pelo muyto que ainda auia que fazer nisso, & que para yr tambem sobre o reyno do Auaa, como desejaua, não era ja tempo, determinou de mandar este seu colaço (a quem, como atras fica dito, tinha dado titulo de seu irmão) sobre a cidade do Sauady, que era daly cento & trinta legoas contra o Nordeste.
  36. [2767](Cap. 185) Sendo informado o Rey do Bramaa, que neste tempo reynaua tyrannicamente em Pegù, do triste estado em que estaua este imperio Sornau; & como todos os grandes delle eraõ mortos por causa dos successos atrâs contados, & que o nouo Rey era homem religioso, sem ter nenhum conhecimento das cousas da guerra, nem pratica algũa das armas, & de sua natureza pusillanimo, & sobre tudo muyto tyranno & mal quisto do pouo, tomando conselho cos seus na cidade de Anapleu onde entaõ residia, sobre esta taõ importante empresa, lhe disseraõ todos que por nenhum caso a deixasse, visto ser aquelle hum reyno dos milhores do mundo, assi em riqueza como em abundancia de todas as cousas, & o fauor que então tinha do tempo & da conjunção lho estauão prometendo taõ barato, que segundo parecia não lhe podia custar mais tomallo que o rendimẽto de hum anno, por muyto que quisesse despender dos seus tisouros, & que tomandoo, ficaua sendo com elle Monarcha dos Emperadores do mundo, & com a honra daquelle supremo titulo de senhor do elifante branco, pela qual causa necessariamente lhe auião de obedecer todos os dezassete Reys do Capimper que nelle professauão as leys das suas verdades; & por suas terras, & cõ suas ajudas podia passar em dez ou doze dias á China, onde se tinha por certo que estaua aquella grande cidade do Pequim, perola sem preço em todo o mundo, & sobre a qual o grande Tartaro, & o Siammon, & o Calaminhan tantas vezes se tinhaõ posto em campo com grossissimos exercitos.

Calaminhans 163(1).

Nas orações: 2368.

  1. [2368](Cap. 163) Estas treze caueyras que estauão encima destes vultos, nos disserão os grepos, que foraõ dos treze Calaminhans que antigamente ganharão aquelle imperio a hũa gente forasteyra por nome Roparoẽs, que por armas o tinha vsurpado aos naturais donde elles todos decendem, & que as mais caueyras que aly viramos naquelles sagiraues que eraõ os pratileyros, foraõ tambem de capitaẽs que na restituyção daquelle imperio fazendo feitos heroicos acabaraõ as vidas honradamente, pelo qual era razão que ja que a morte lhes tinha tirado o premio que mereceraõ por suas obras, lhe não tirasse o mundo a memoria que se lhes deuia, o qual aos bõs & animosos faria inueja com que se lhes acrecentasse o animo, & aos fracos & couardes seria confusaõ de sua fraqueza.

Calaminhás 194(1).

Nas orações: 2924.

  1. [2924](Cap. 194) E aos noue dias de Março do anno de 1552. abalou do Tanguu, que era a sua patria, com hum exercito de trezentos mil homẽs, de que os cinquenta mil sómente eraõ Bramaas, & todos os mais eraõ Moẽs, Chaleus, Calaminhás, Sauadis, Pamcrùs, & Auaas: assi que destas seis naçoẽs era a mayor parte de toda esta gente, as quais habitaõ pelos rumos de Leste & Lesnordeste o sertão destes reynos, em distancia de mais de quinhentas legoas, como se pode ver num mapa, se a sua graduação estiuer verdadeyra.

Calaminhãs 114(1), 122(1), 149(1).

Nas orações: 1523, 1637, 2111.

  1. [1523](Cap. 114) E abaixo destes doze ha quarẽta Chaẽs, que saõ como Visorreys, a fora outras muitas dignidades mais inferiores, que saõ como Regedores, Gouernadores, Veadores da fazenda, Almirantes, Capitaẽs mores, que se nomeão por Anchacys, Aytaos, Põchacys, Lauteaas, & Chũbins, os quais todos ainda que nesta cidade, que he a corte, saõ mais de quinhentos, nenhum traz estado de menos de duzentos homẽs, & os mais delles, para mayor espanto, saõ gentes estrangeyras de diuersas naçoẽs, dos quais a mayor parte saõ Mogores, Persios, Coraçones, Moẽs, Calaminhãs, Tartaros, & Cauchins, & algũs Bramaas, do Chaleu & Tanguu, porque dos naturais não fazem conta por ser gente fraca, & para pouco, inda que muyto habiles & engenhosos em todo o negocio mecanico, & de agriculturas, & arquiteitos de engenho muyto viuo, & inuẽtores de cousas muito sotis & artificiosas.
  2. [1637](Cap. 122) Estes quatro moços & o Mitaquer que era o que nos guiaua, passaraõ daquy por hum corredor armado sobre vinte & seis colunas de bronzo, & delle entramos em hũa grande sala de madeyra como terecena, na qual estaua muyta gente nobre, em que auia alguns estrangeyros Mogores & Persios, Berdios, Calaminhãs, & Bramaas do Sornau Rey de Sião.
  3. [2111](Cap. 149) E querendo este Rey Bramaa por grandeza de estado festejar esta entrega do Chaubainhaa, mandou que todos os capitaẽs estrangeyros com sua gente armada & vestida de festa se pusessem em duas fileyras a modo de rua para vir por ella o Chaubainhaa, o que logo foy feito, & esta rua tomaua desda porta da cidade até a sua tenda que seria distancia de dous terços de legoa, na qual rua estauão trinta & seys mil estrangeyros, de quarenta & duas naçoẽs, em que auia Portugueses, Gregos, Venezeanos, Turcos, Ianiçaros, Iudeus, Armenios, Tartaros, Mogores, Abexins, Raizbutos, Nobins, Coraçones, Persas, Tuparaas, Gizares, Tanocos da Arabia Felix, Malauares, Iaos, Achẽs, Moẽs, Siames, Lusoẽs da ilha Borneo, Chacomaas, Arracoẽs, Predins, Papuaas, Selebres, Mindanaos, Pegùs, Bramâs, Chaloẽs, Iaquesaloẽs, Sauadis, Tãgus, Calaminhãs, Chaleus, Andamoens, Bengalas, Guzarates, Andraguirees, Menancabos, & outros muytos mais a que não soube os nomes.

(2) Objecto geográfico interpretado

Império. Parte de: Asia.

Reino, gentílico. GT identificação precária com o Tíbete. FMPP: Lan Sang, Laos hoje em dia.

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